Xófeus
já havia despachado alguns generais para algumas localidades menos importantes:
A Ilha de Yurth’Hur(A deusa), a Fortaleza de Kna’Ma’Ka, as Ilhas do Graveto, e
mais algumas ilhas nos continentes de Trovergo, Ferulum e o Velho Continente
dos Homens. A guerra começaria assim que todas as terras necessárias fossem
obtidas pelo singelo poderio que se encontrava no subterrâneo da Ilha de
Rardinia, esse poderio era formado por pouco mais de três mil homens,
quinhentos espectros de sempre-noite, duzentos que residiam no subterrâneo de
Kna’Ma’Ka e mil e setecentos demônios que habitavam as terras perdidas de
Jorath. Os espectros de Kna’Ma’Ka já estava marchando em direção ao extremo
norte de Vertago. Mury Maz Zir, uma das capitãs de Xófeus, marchava ao extremo
sul de Vertago. Sobre Galea fora imposta a tarefa de atacar Vertago no
Castelo-de-Velir, onde a maior força daquele bloco de terra estava. É uma tarefa difícil, até para mim ou Hugh,
é uma tarefa difícil.
Clarisse e Hugh eram os
principais capitães de Xófeus. Zirdul era tão forte quanto seu irmão, e isso
fazia dele um igual aos olhos do Senhor Comandante do exército que iria marchar
para tomar os reinos.
Seria
uma tarefa difícil. Cinco anos atrás, não conseguiram tomar os reinos com
Setenta e três mil combatentes ao lado, fazer isso com menos de quatro mil
parecia impossível... Mas, o plano... Com
esse plano, há uma chance. É arriscado, mas há uma chance...
- Senhor, não sei se sou
pronta para essa tarefa. Atacar as forças Castelo-de-Velir em campo aberto e
vencer é praticamente impossível, o castelo nunca foi tomado, senhor. – A
expressão de Galea era de medo. Ainda
assim, ela tem coragem de admitir que teme não realizar a tarefa imposta por
seu mestre... – Quase todos que marcharem comigo vão morrer, alguns vão
correr, e isso vai diminuir nossas forças. Precisamos de uma distração...
- Uma
distração, certo? Querida Galea, e se eu te dissesse que você é a distração? –
Xófeus sorriu. Um sorriso com nada de alegria ou calor, seu sorriso era frio. –
Vai colocar seus homens em batalha e atacar o maldito castelo, e se morrer,
morrerá lutando. É mais do que se pode desejar. Uma morte limpa e sem dor. –
Xófeus não temia a morte. Ele já beijou a
morte nos lábios... E voltou. – Morra em batalha, senhora, ou morrerá aqui.
A
mulher com o longo vestido de cor safira se levantou, pálida, e saiu da sala.
Nesse momento Clarisse soube que ela iria atacar. Bem, mais um, então. E,
agora, as coisas ficam interessantes...
Xófeus ordenou
que Lorath, Peter e Verdana descessem toda a costa de Vertaro e as ilhas
próximas, e queimassem toda floresta que protegia o vale. E também que
destruíssem as Pontes-U, no Véu. Tenos
matou mais de trezentos homens naquelas pontes malditas. O filho da puta matou
meu irmão. Destruir essas pontes era inteligente, elas eram
o único contato por terra que a parte sul do Véu tinha com a parte
norte. O Véu era constituído de duas ilhas maiores, divididas por água, e também
cinco ilhas minúsculas entre essa divisão de Água, e ali foram construídas as
Pontes-U. Tinham esse nome porque o conjunto das pontas formava a letra U, mas
de ponta-cabeça. Os três aceitaram a tarefa, e saíram.
Para
Hugh, a tarefa era invadir o Véu pelas três filhas de Shaya. As três filhas
eram três montanhas que foram nomeadas em Homenagem a Shaya, que morreu na
Guerra dos Cinco. Eu matei-a, vinguei-me.
A menor montanha era chamada de Judith, a menor filha. As duas maiores eram
chamadas de Roselena e Talilak. Uma vez que ele tivesse entrado no Véu, pelas
filhas, ele deveria atacar a Fortaleza-Véu, que ficava a norte das Pontes-U.
“Que a esse ponto já deverão estar queimadas”, disse Xófeus. E então, Hugh se
foi.
Para
Clarisse, foi dada a tarefa de tomar cada um dos treze fortes de Vertaro,
começando pelo Forte do Mar-Livre. Forte
do Mar-Livre é onde aquela filha adotiva do antigo capitão Valir reside.
Lerrino Goss Velir, eu não pude te matar, mas matarei sua filha... Lerrino
havia matado a mãe de Clarisse numa batalha que aconteceu no Forte do
Mar-Livre. Vingarei você, mãe, no mesmo
lugar em que morreu. Depois que Genya morreu, Zirdul matou o capitão Velir.
Helena viu seu pai morrer, assim como Clarisse viu a mãe morrer. Mas Clarisse
desejava vingança pelas próprias mãos. As
únicas pessoas que Zirdul ama além de seu irmão, era minha mãe. Ele ainda a
ama, mesmo ela tendo partido... Clarisse sentia saudade da mãe, e de um pai
que nunca teve. Zirdul tomou-a como protegida depois da batalha, pelo amor que
tinha por sua mãe, mas nunca realmente a amou como tinha amado Genya.
Mas,
quando Xófeus escapou de suas correntes, tomou-a como filha. A coisa mais
próxima que Clarisse tinha de um pai era Xófeus. E considerava Zirdul como um
tio.
Aceitou
a tarefa de tomar os fortes de Vertaro, fez uma reverência, e tomou direção á
porta da sala onde estavam.
-
Volte, Clarisse. Quero que você fique. Precisa saber para onde Zirdul vai
marchar, e para onde eu marcharei. –
Clarisse ficou surpresa. O senhor da Morte iria marchar, ao invés de apenas
mover suas peças. Sentou-se e olhou seu mestre. – Eu vou para Mata de
Solás-Véu, não posso revelar o que vou fazer, nem mesmo para vocês.
Houve
uma pausa...
-... E Zirdul
marcha até os escudos...
Mais
uma pausa...
- Mas,
antes disso, ele passará no Véu para recuperar uma velha amiga... Aquela, das
esmeraldas...
Mais
uma pausa. Mas Clarisse já tinha entendido tudo nesse ponto.
Suhsahna. A filha bastarda de Zucko.
Ninguém
vivo, a não ser os três que estavam naquela sala, sabia que Suhsahna detinha do
sangue de Zucko.
- Uma
vez que estiver nos escudos, com a bastarda, Zirdul vai nos esperar... E então,
atacamos Além-Véu.
- Mas,
qual a importância da bastarda..? – Perguntou Clarisse, e a resposta lhe veio
de súbito.
Sangue antigo circula o corpo da bastarda.
Sangue de Zucko e sangue Iggard. Clarisse sorriu. Xófeus Sorriu. Zirdul
gargalhou.
- Sim,
Clarisse. Sangue. – Disse Xófeus. E então, um alarme soou, ouviram gritos
vindos de um corredor, um andar abaixo do qual estavam.
Correram
da sala, os três. E encontraram Hugh tentando fugir com um grupo de detentos do
Véu, Além-Véu e d’Os Escudos. Mataram quase todos, deixaram Hugh e duas
mulheres vivas, a pedido de Xófeus. Uma adulta, e uma adolescente. Na confusão
da batalha, Xófeus quase foi esfaqueado por Hugh nas costas. Salvei-o no momento exato. Não fosse por
mim, estaria morto, senhor da Morte. Levaram os três vivos para uma sala
mal iluminada, Clarisse e Zirdul saíram da sala, deixando apenas Morte e os
três na sala, e mais três servos de Xófeus. Um desceu com um archote. Clarisse
e Zirdul deixaram a sala, e esperaram onde o conselho estava ocorrendo. Ficaram
lá por um tempo e nada aconteceu. E então, ouviu-se um grito cortante. De pura
raiva...
... Era
Xófeus...
... Ao
chegarem à sala, Hugh estava morto, com uma adaga no peito. As duas mulheres,
os três servos e mais um que havia chegado depois estavam mortos, com
queimaduras pelo corpo todo. E Xófeus estava sentado numa grande cadeira de
pedra, respirando ofegante. Ele estava com raiva.
-
Mudança de plano, senhores. Eu vou marchar sobre o Véu, e vou destruir cada
maldito pedaço de pedra naquela maldita terra. Hugh era um espião. Um filho da
puta de um traidor. Estava tentando fugir com os prisioneiros que seqüestramos
quatro anos atrás. Lembram-se disso? – Xófeus perguntou. Ele falava rapidamente
e só então parou pra respirar. – Vocês dois estavam juntos. Nesse dia. Nesse
dia que eu acordei. Eu confiei no Rartig, e ele me traiu.
Xófeus
se levantou.
- Eu
não pretendia matar os habitantes do Véu que quisessem me prestar vassalagem.
Faria deles servos. – Escravos,
pensou Clarisse. – Agora, pretendo
matar cada filho da puta que ousar se opuser á mim. Desde Kna’Ma’Ka, até Além
Véu. De Vertigo, até Trovergo.
Agora as coisas ficaram mais
interessantes... Pensou Clarisse, sem conseguir dizer nada. Zirdul
gargalhou, fez uma reverência, e disse:
- Vou
pegar a bastarda. – Disse, e virou-se... Então Xófeus respondeu.
- Sim,
você vai pegar a bastarda. Mas antes, toque o caos onde quiser. E me entregue
uma mensagem... Envie uma mensagem para cada Forte, Fortaleza ou Castelo nas
terras de Trovergo, Vertigo e Gutaro. Uma mensagem bem simples, ‘preparem-se’,
e certifique-se de ser criativo para entregar as mensagens. – Terminou de
falar. Não sorriu e não expressou nada que não fosse raiva. Eu nunca o vi assim. Ele claramente odeia
ser traído. Era a segunda vez que isso aconteceu ao Senhor da Morte.
Xófeus
desapareceu, sugando toda a luz da sala, numa nuvem de sombra.
Zirdul
pegou um dos corpos de algum dos servos que seguravam archotes e fez o morto se
levantar. Clarisse se espantou. Além de
dominar as magias de controle da mente, tortura e ilusões, ele é um necromante.
Tocando a testa do morto com o dedo indicador da mão esquerda, plantou uma mancha
azul na testa do morto-vivo, e então conjurou um pedaço de pergaminho. Escreveu
algo que Clarisse não pôde ver e colocou- no bolso da túnica do homem amaldiçoado
com a mancha azul na testa, a mancha se espalhava lentamente...
Tocou-o
na testa, novamente, dessa vez com a mão inteira. E então o homem desapareceu.
Clarisse viu, pela segunda vez no dia, a luminosidade da sala desaparecer.
Poucos dominavam esse feitiço, de se transformar em sobras e reaparecer na
forma humana em outro lugar. O pequeno homem vestido de cinza respirou
ofegante. Essas magias o deixaram cansado.
Descansou, por alguns segundos, e agarrou-se ao corpo de Hugh. E, pela terceira
vez naquele dia, a luminosidade da sala foi envolvida por sombras.
Clarisse
estava sozinha na sala, e pôde olhar melhor os cadáveres. Reconheceu, então, a
mulher e a filha de Hugh... A mulher havia sentido a adaga na mão, a mesma
adaga que se encontrava no peito de Hugh. Então,
Xófeus perdeu um de seus generais... Perdeu seu único amigo.
Queimou
os corpos que se encontravam ali, e depois de alguns minutos, saiu da sala e
andou pelos longos corredores subterrâneos daquela caverna que se encontrava em
Rardinia. Eram todos construídos em mármore negro, tinham certa beleza não
muito comum. Uma beleza terrível, e refletia parcialmente a iluminação gerada
pelos archotes... Fez uma curva para a direita, depois de estar andando por
certo tempo. Viu um espectro passando, transparente, e parou para olhá-lo...
Não posso sentir a presença deste um. Mesmo
sendo um espectro, deveria sentir a presença de sua memória, há algo errado...
Ouviu passos, e ficou atenta.
Espectros não produzem som, exceto quando
falam. Uma pessoa se aproximava em direção oposta á que Clarisse andava.
Uma pessoa se aproximava em direção á que Clarisse andava. Estava cercada num corredor
estreito. Viu a pessoa na sua frente primeiro, e então a atacou. Lançou um
projétil de gelo em direção ao monte de trapos que se movimentava, obviamente a
pessoa não queria ser identificada. O projétil foi defendido, e nisso o
espectro enfraqueceu. Uma ilusão. Uma
distração.
Atacou o monte de trapos
novamente, com um projétil maior, e de fogo. Foi desviado de lado, e a vítima
atacou, então. Clarisse espantou-se com a força do ataque, e a dificuldade que
teve para livrar-se dele. Chicotes de fogo formaram-se no ar, e começaram a se
fechar em volta do alvo que atacava. Livrou-se do ataque com uma bolha que
formou em volta de si mesma, eliminando todo o ar dali de dentro. Sem ar, sem fogo. É um dos antigos
mistérios. Por um momento, Clarisse se lembrou da pessoa que estava vindo
pelo outro lado. Virou, e tudo que pode ver foi uma adaga penetrando sua
barriga, então uma espada, vinda de trás. Então, não sentiu mais nada, apenas
caiu com seu próprio peso. A ultima coisa que viu foi a face do segundo
atacante. Que rosto lindo, pensou.
Seu
ultimo pensamento. Não conseguiu dizer nada, e então morreu no chão frio de
mármore negro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário